sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Miando na árvore errada

Comentário sobre o artigo abaixo:

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Opinião

Miando na árvore errada
* LUÍS EDUARDO ASSIS

    Depois de tórrida paixão e juras de amor eterno, parece que a fascinação dos analistas internacionais pela economia brasileira arrefece. Aqui e ali, lentamente, surgem comentários que levantam dúvidas sobre a consistência do crescimento que temos festejado. O argumento mais recente é tão dramático quanto equivocado. Há cassandras que defendem a ideia de que a economia brasileira está se aproximando de um colapso provocado pelo esgotamento de um ciclo de crédito. Com a alta das taxas de juros, elevou-se o comprometimento com o serviço da dívida, que teria alcançado 28% da renda, ante 16% nos EUA. A inadimplência cresce e os bancos reduzem os empréstimos,o que só faz agravar o quadro. Como normalmente o crédito deteriora apenas depois da queda da renda e do emprego, essa antecipação indicaria um problema estrutural de grandes proporções.
   Ora, é fato que a inadimplência tem crescido,no rastro das medidas anti-inflacionárias tomadas pelo próprio Banco Central. Mas há vários elementos que desautorizam a previsão de que estamos no limiar de uma ruptura. Em primeiro lugar, o sistema bancário brasileiro sempre foi estritamente normatizado pelo Banco Central, que não em barcou na ideia da desregulamentação.
     O mercado de produtos derivativos, por aqui, continua incipiente e na sua quase totalidade os empréstimos permanecem nos livros dos bancos originadores até o término de seus respectivos prazos. Isso induz os emprestadores a uma análise mais rigorosa dos riscos de crédito, já que a relação é duradoura. Também os empréstimos imobiliários representam entre nós uma pequena
fração do crédito total (4%).
     O núcleo da crise financeira que ainda assola os países ricos foi o mercado imobiliário, justamente porque a concessão indiscriminada de crédito – que era repassado adiante numerosas vezes mediante a utilização de engenhosos derivativos–gerava a demanda necessária para a valorização dos próprios ativos que garantiam esses empréstimos. Disso resultou um círculo vicioso que estimulava novas concessões de empréstimos nas quais pouco se analisava a capacidade de pagamento do mutuário, já que a valorização da garantia tornava o negócio interessante. Não temos nada disso aqui.
   Nossos problemas são outros. Nada indica que aqui teremos uma súbita parada no crescimento por conta da necessidade de digerir dívidas do passado. A inadimplência, ainda que alta, está sob total controle, os bancos são sólidos e rentáveis e a economia caminha para um pouso suave. Claro, o Brasil não é uma nova China. Embriagamo-nos como crescimento de 7,5% no ano passado, o maior desde 1986, enquanto há exatos 20 anos consecutivos a China cresce acima desse nível. Mas também não estamos encalacrados com dívidas que esclerosam os dutos econômicos e impedem o crescimento.
      Em que pese o aumento do crédito, o total da dívida como proporção da renda líquida das famílias está em 42%, muito baixo do mesmo indicador para o Reino Unido (171%), EUA (104%), Alemanha (99%) ou Itália (88%). O total de crédito como proporção do PIB estabilizou-se, depois de forte crescimento, em 46%-47% do PIB, com apenas 37% deste montante dirigido para consumidores pessoas físicas.
   O cálculo do comprometimento da renda é de metodologia frágil e impede qualquer conclusão. Não há risco de estouro da bolha de crédito pela boa razão de que ela não existe. O gato subiu em outra árvore. Melhor seria nos preocuparmos com os juros altos; com a apreciação exagerada do real, que pode reverter e assustar os incautos quando o quadro internacional não for tão favorável para nós; coma enorme carga tributária que recicla recursos por meio do governo e transforma dinheiro bom em dinheiro ruim; e, principalmente, com a incapacidade de reduzir o crescimento dos gastos públicos, o que ameaça a inflação. Nossa agenda está cheia de problemas. Não precisamos nos importar com falsas questões.

* ECONOMISTA. FOI DIRETOR DE POLÍTICA MONETÁRIA DO BANCO CENTRAL DO BRASIL E PROFESSOR DA PUC-SP E FGV-SP / E-MAIL: LUISEDUARDOASSIS@GMAIL.COM

Fonte: Jornal O Estado de S. Paulo, 06 de Agosto de 2011, B2.

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