Eng. Jomázio de Avelar
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parece fácil. Parece. Na verdade, cada um, em sua vida particular ou atividade
profissional, conhece as consequências das escolhas: acertos e erros; o que
parece acerto, por vezes, ao final, mostra-se na verdade um erro, e muitas
vezes dá-se o oposto. Porém, a ninguém é negado o direito de se apoiar em
conceitos probabilísticos.
A Engenharia
econômica, que compõe viabilidade física, apoiada na técnica, com viabilidade
econômico-comercial, pressupondo-se possibilidade financeira, conjuga tais
ingredientes nas decisões de implantação de empreendimentos. A Engenharia, em
todos os campos, se ocupa de viabilizar empreendimentos; estudos, inicialmente,
e execução posteriormente. Daí a importância dos Engenheiros no desenvolvimento
dos países. O Presidente Barack Obama, em seu discurso de posse, salientou:
“Nossa jornada não estará completa até que encontremos uma maneira melhor de
receber os imigrantes esforçados e esperançosos que ainda veem os Estados
Unidos como o país das oportunidades; até que os jovens estudantes e
engenheiros brilhantes passem a formar parte de nossa força de trabalho em
lugar de serem expulsos do nosso país”. Se ele valoriza os engenheiros
estrangeiros para trabalhar nos EUA, certamente valoriza os engenheiros
americanos, por sua contribuição para superar a crise que estão enfrentando. É
um alerta aos governantes brasileiros,
para que imitem o presidente americano, que já está preparando uma lei de imigração.
Trem-bala
Rio-São Paulo-Campinas é um empreendimento curioso: pouco ou quase nada de
estudo e muito de teste prático da viabilidade econômico-comercial. Que tipo de
teste? Todas as tentativas de implantar o empreendimento na modalidade de
concessão falharam; o fato de os editais de convocação internacional não terem
atraído um licitante sequer em todo o planeta prova a sua inviabilidade. Apesar
disso, o governo federal insiste em implantar o empreendimento. Agora dividiu a
implantação em duas partes (possivelmente supondo que tal divisão supera a
inviabilidade. Engano!): a primeira, com leilão previsto para setembro de 2013,
será contratada pelo proponente vencedor da tecnologia e condições de operação
do trem-bala. O consórcio vencedor dessa parte terá a participação de empresas
privadas com 55% e 45% assumidos pela EPL (Empresa de Planejamento e Logística
– estatal recém-criada) em valor estimado de R$ 7,67 bilhões – o edital
assegura que o BNDES financiará 70%, com juros favorecidos e prazo de 40 anos,
o mesmo prazo da concessão. Os 30% restantes, totalizando R$ 2,30 bilhões,
serão divididos entre os consorciados, na proporção da participação respectiva.
Assim, o consorciado proponente da tecnologia terá de desembolsar apenas R$
1,27 bilhão e terá o controle total e a liderança do empreendimento de custo
estimado pelo governo de R$ 35 bilhões (nossa estimativa é de R$ 70 bilhões).
Superada essa
fase, deverá iniciar-se a segunda parte, com previsão para o primeiro semestre
de 2014, quando será contratada a construção da ferrovia que é a obra civil
propriamente dita, com custo estimado pelo governo em R$ 27 bilhões. Essa
estimativa não é segura, visto não haver projeto no qual se basearem os estudos
econômicos e de valoração, além de depender da tecnologia apresentada pelo
proponente vencedor da primeira parte. Vê-se, tudo inserto.
Aparentemente, o
edital poderá atrair proponentes. Resta, lá na frente, conferir se o valor
mínimo da outorga da exploração do sistema, a ser pago no prazo de 40 anos, vai
acontecer, pois dependerá de demanda pouco conhecida. Os construtores da
ferrovia certamente estarão garantidos de receber pelos serviços prestados para
executar uma obra de R$ 27 bilhões para o governo federal. O Tesouro Nacional
sempre terá caixa para pagá-los (o recurso sempre provém de impostos ou de
avanço no endividamento público).
Aqui reside o
ponto nevrálgico da decisão de implantar o empreendimento trem-bala Rio-São Paulo-Campinas: o investimento cairá
no Tesouro Nacional, inicialmente dispêndio da ordem de R$ 70 bilhões e,
posteriormente, dispêndio de valor anual desconhecido para custear as despesas
de operação e manutenção. Essa conta será, para sempre, paga pelas futuras
gerações.
Os governantes
deveriam informar a população que os metrôs brasileiros, construídos com
recursos públicos (investimento), têm seu custo operacional inviável, fato que
ficou comprovado na contratação de terceiros para operar a linha 4 do Metrô de
São Paulo. O governo do Estado tem de completar a receita anualmente para que o
contratado alcance o equilíbrio receita-despesa. Nas demais linhas, o montante
não é diferente. As promessas eleitorais de implantação de linhas de metrô têm
seu custo para o povo. Não está em discussão se se deve ou não construir o
metrô. Apenas os governantes devem informar que o metrô é subsidiado.
A
Transnordestina, com orçamento inicial de R$ 4,5 bilhões em 2007, teve seu
orçamento revisto para R$ 7,5 bilhões para 2013 (reportagem do Estadão, de 26/05/2013). E quando
será concluída?
As obras de
Transposição do Rio São Francisco, com orçamento inicial de R$ 4,8 bilhões, com
orçamento revisado para R$ 8,2 bilhões (reportagem do Estadão, de 19/05/2013), estão paralisadas. Quando será concluída a
obra?
A implantação do
empreendimento trem-bala poderá comprometer investimentos de muitos
empreendimentos altamente necessários e de viabilidade mais facilmente
comprovável, como a exportação de grãos cuja produção é um privilégio do
Brasil, seja pela excepcional dimensão da área agricultável, seja pela
tecnologia desenvolvida pela EMBRAPA e aplicada pelos brasileiros. O transporte
de carga, de forma geral, que inclui grãos, precisa ser alçado à condição de
prioridade e ter custo competitivo. Um dos investimentos prioritários é no
transporte ferroviário de carga, e não de passageiros, representado pelo
trem-bala. O trem-bala seria denominado na época do regime militar de “obra
faraônica”. Voltamos ao passado?
Há mais de 230
anos, o economista Adam Smith argumentava que, quando a infraestrutura for paga
por si mesma, será menos provável termos elefantes brancos de pouco valor
social.
O tema aqui
abordado alerta para a necessidade de valorização do engenheiro brasileiro e
sua adequada formação, como temos insistido em nossas manifestações.
Engenheiros preparados, bem formados e brilhantes contribuem nas decisões sobre
prioridade e investimentos com retorno, com base em viabilidade e administração
de risco. Risco físico, econômico, financeiro e comercial. É inadiável a
decisão de planejar a construção de nossa infraestrutura material, a logística de
transportes que nos possibilite praticar competitivamente o comércio com o
mundo e mesmo no âmbito de nosso mercado interno.
Constatamos
enorme desperdício de dinheiro (em bilhões); a conta virá. Veja-se a crise dos
países desenvolvidos. A lição é gratuita, e não estamos aprendendo. Não se
trata de posição contra o governo, mas de posição a favor do Brasil. E os
Engenheiros brasileiros precisam estar mais atentos e atuantes.
São
Paulo, 28/05/2013